Vídeo viralizou com pessoas contando suas idades em programa nos anos 80 — Foto: Reprodução/SBT
Noticias relacionadas
Já teve a experiência de olhar fotos antigas dos seus pais ou dos seus avós na juventude e ficar com a impressão de que eles pareciam mais velhos? Nos últimos dias, o assunto tomou as redes com um vídeo viral que mostra um programa de auditório da TV nos anos 1980 com pessoas contando suas idades, mas que a internet pareceu não acreditar. (Veja o vídeo abaixo.)
➡️ Será que no passado, as pessoas pareciam mesmo mais velhas? Apesar de alguns hábitos terem mudado, como redução no número de fumantes, menos trabalhos expostos ao sol e mais consciência sobre a qualidade da alimentação, não há evidência científica que demonstre que quem tinha 20 anos no passado tenha uma aparência diferente de quem tem 20 anos hoje.
🚨 O que especialistas explicam é que isso é uma ilusão.
Jovem de 19 anos em programa de TV dos anos 80 — Foto: Reprodução/SBT
- Faça um teste:
👉 A jovem na imagem acima conta no vídeo que tem 19 anos. Ela traz no visual símbolos dos anos 80: o cabelo com “permanente”, uma técnica que deixava os cabelos cacheados, bem volumosos. Além do corte, os brincos.
👉 Agora, tente imaginar: pense na mesma mulher, mas com um corte de cabelo mais atual, um brinco mais moderno, uma maquiagem mais contemporânea e chamativa.
Provavelmente, você vai conseguir enxergá-la mais jovem. É como acontece em programas de transformação, nos quais a mudança no estilo faz a pessoa parecer ter alguns anos a menos.
Para Jussara Romão, especialista em moda e autora do livro que aborda a trajetória dos últimos 100 anos da moda no país, a imagem da juventude está ligada a símbolos: as roupas, os cabelos, os acessórios e a forma de se comportar. E esses símbolos não são permanentes.
Ou seja, as pessoas no vídeo, seus pais e seus avós não pareciam, de fato, mais velhos. É que quem vê a imagem tem uma ideia diferente do que é jovem. É como uma “ilusão de ótica”.
Jussara explica que, nos anos 80, o estilo era mais sóbrio e imprimia a ideia de respeito, o que fazia com que as pessoas jovens passassem a imagem de mais maduras.
Nas imagens, a gente vê mangas bufantes, homens de camisa aberta com peito exposto, o permanente nos cabelos. Esses são símbolos do que tinha de mais moderno na época. Ou seja, eles têm, sim, a idade que dizem ter. O que ocorre é que essa imagem não é a imagem que nós temos do que é jovem e cria essa ilusão.
— Jussara Romão, especialista em moda
A especialista ainda cita a postura sóbria das pessoas, que é diferente da que vemos em jovens atualmente, mais conectados ao entretenimento das redes sociais. Isso também ajuda a dar a falsa impressão de que a pessoa no vídeo é mais madura.
A mudança na visão da juventude
A coordenadora do núcleo de doenças da beleza da PUC-Rio, Joana Novaes, explica que, para além dos símbolos, a visão sobre a juventude tem a ver com o comportamento atual: há uma valorização maior sobre ser jovem, que é considerado um valor.
Vivemos em uma sociedade de consumo, que aclama a performance. Com isso, a juventude é um atributo até profissional. Por isso, as pessoas têm buscado parecer cada vez mais novas, seja com as roupas, com comportamentos e até procedimentos estéticos.
— Joana Novaes, coordenadora do núcleo de doenças da beleza da PUC-Rio
🚨 Joana ainda reforça que a distorção da imagem, com o uso de filtros, ferramentas de manipulação de imagem nas redes e os inúmeros procedimentos estéticos são riscos à saúde mental. Para ela, a forma como enxergamos a juventude hoje é o gatilho que deixa tantas pessoas vulneráveis aos transtornos de imagem.
“Quando isso se torna um valor moral, você precisa se sacrificar para ser o mais jovem o maior tempo possível”, explica.
O ‘padrão de corpo’ feminino ao longo do tempo
Cuidado com o que você diz nas redes, isso pode ser etarista
“Ah, mas você não parece ter essa idade” ou “nossa, parece mais velha” são frases que expõem o estigma da velhice, resumindo a primeira impressão de uma pessoa em sua idade. Isso é etarista.
➡️ Artistas como Andreia Beltrão têm falado sobre isso nas redes: por que ouvir que não parece ter a idade que tem é considerado elogio? E por que não se pode ter a idade que tem? Aos 58 anos, Beltrão chama à reflexão do quanto etarista isso pode ser.
Naira Dutra Lemos, presidente do departamento de gerontologia da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia, reforça que o apontamento da idade, seja para achar que a aparência é mais velha (como no vídeo) ou mais jovem, como no caso de Andreia, é um comportamento etarista.
Isso reforça o estigma de envelhecer. A pessoa se sente forçada a imprimir uma juventude que não tem e ainda é colocada sobre o julgamento das demais, que podem dar a ela mais ou menos idade. Por que não podemos ter a nossa idade?
— Nara Dutra Lemos, da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia